Terceira Câmara Cível do TJRS mantém demissão de servidor público condenado por subtrair combustível do município
Funcionário pedia a reintegração ao cargo de motorista da Prefeitura de Dom Pedrito
Na última terça-feira (07), o Relator da Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Eduardo Delgado, manteve a demissão do servidor público municipal, Aragir Cabral de Oliveira, por subtração de combustível do município. Conforme a decisão, agora em segunda instância, “trata-se de recurso de apelação interposto por Aragir contra a sentença de denegação da ordem, proferida nos autos do mandado de segurança impetrado contra ato do Prefeito Municipal de Dom Pedrito. Nas razões, o recorrente menciona a nulidade do ato administratvo de demissão, por ausência de motivação, a afastar a possibilidade de aferição acerca de eventual desvio de poder ou de finalidade, requerendo provimento do recurso”.
Ainda na ação em primeira instância, ele pedia a reintegração ao cargo de motorista da Prefeitura de Dom Pedrito e pagamento de verbas remuneratórias, alegando que na sindicância 02/14 e no processo administrativo 186/14, instaurados para apurar desvios de combustíveis, foram utilizadas provas emprestadas, e a comissão promoveu diligências para coleta de prova sem que tenha sido assegurado ao servidor o direito de acompanhar o processo. Enfatiza que a decisão não apresenta motivação para a penalidade, que a indiciação não especificou os fatos a ele imputados, tampouco o embasamento legal, bem como que foi indeferido o pedido de que seu depoimento fosse tomado ao fim do processo.
Nesta fase, o Juiz de Direito da Comarca de Dom Pedrito, Luis Filipe Lemos Almeida, decidiu “como já referido na decisão liminar, a Portaria 1027/14 que determinou a instauração do PAD define como objeto “irregularidades no uso do cartão de combustíveis veiculares”, o qual descreve o pagamento do abastecimento realizado por meio de cartão corporativo do impetrante de veículo Ford Ranger na cidade de Bagé, malgrado o veículo estivesse em festival em Dom Pedrito.
Quanto à defesa processual, o impetrante foi cientificado da acusação e diversos atos processuais, constituiu advogado, foi interrogado na sindicância e lhe foi facultada a possibilidade no PAD por mais de uma vez, o que mitiga a suposição de cerceamento de defesa, até pelo contrário, pois a Comissão Processante zelou para manter a higidez do processo, inclusive redesignado o primeiro interrogatório diante das teses defensivas de o ato ter de ser realizado ao final, ainda designando uma terceira data com este desiderato, na qual o servidor sequer compareceu.
Ademais, a deliberada ausência ao interrogatório (que só pode ser atribuída ao impetrante) não pode obstar o curso do processo, malgrado também não prejudique processando, haja vista a lide versar sobre direitos indisponível, tampouco enseja a nomeação de dativo, frente aos termos do art. 173, caput, da Lei Municipal , já que esta hipótese é reservada para quando o indiciado não constituir defensor, o que não é o caso, já que o impetrante constituiu “PARA O FIM ESPECIAL E EXCLUSIVO DE REPRESENTÁ-LO JUNTO AO PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR INSATUARADO PELA PORTARIA 1027/14 DA PREFEITURA MUNICIPAL DE DOM PEDRITO – RS”.
E as provas após produzidas, consistentes na inquirição de testemunhas, foram acompanhadas pelo procurador constituído, o que possibilitou o efetivo contraditório e ampla defesa. Assim, não tendo impetrante pedido a renovação de qualquer ato após a formal instalação do PAD, malgrado notificado do resultado e provas da sindicância, tal “omissão” processual somente a si pode ser atribuída, já que a Lei Municipal 236/91 não determina compulsória renovação, mas apenas a juntada da sindicância , isso sem referir o caráter fetichista do pleito, pois não esclarece o motivo.
Portanto, se a Lei não prevê outra penalidade para o “ladrão do patrimônio público”, parece intuitivo que a mera referência ao artigo que estabelece a sanção já é fundamento mais do que suficiente para sua imposição, já que se trata de ato administrativo vinculado e não discricionário. E mesmo que assim não fosse, a comissão processante fez referência a pelo menos um fundamento na dosimetria da pena (“como sendo o único beneficiários nos abastecimentos realizados com os cartões e senhas”), o que é idôneo para a demissão, pois, afinal, o desvio era para favorecer o próprio servidor que o praticava, o qual foi acolhido pela autoridade com competência ao ato demissionário. Não há de se confundir ausência de fundamentação com fundamentação sucinta, o que também afasta o derradeiro argumento para macular o PAD. Nada há ser reparado no procedimento administrativo, até pelo contrário, pois a comissão processante mostrou-se inclusive com um zelo demasiado, do que decorreu apenas prejuízo para o Município, diante do pagamento de salários.
Decisão do Relator Eduardo Delgado (Resumo)
A matéria devolvida reside na nulidade do ato administrativo de demissão, por ausência de fundamentação. No ponto, por economia, peço licença para adotar como razões de decidir, o parecer do Ministério Público, da lavra da e. Procuradora de Justiça, Drª. Bárbara Fernandes Rosa Cerqueira: ” No que tange ao mérito, não prospera a irresignação, devendo ser mantida na íntegra a bem lançada sentença. Conforme sustentou o Julgador na decisão que indeferiu a liminar, a Portaria 1027/14 que determinou a instauração do PAD define como objeto “irregularidades no uso do cartão de combustíveis veiculares”, fazendo remissão à Portaria 43/14, que por sua se reporta ao memorando 107/13, o qual descreve o pagamento do abastecimento realizado por meio de cartão corporativo do impetrante de veículo IOW1567 na cidade de Bagé, malgrado o veículo estivesse em festival em Dom Pedrito.
Da mesma forma, a descrição sucinta e não pormenorizada é admitida no processo administrativo, desde que haja minimamente a delimitação de seu objeto, permitindo a correlação da decisão com a acusação, o que ocorreu no caso. Quanto à defesa processual, a mesma foi exercida de forma ampla pelo impetrante, não se vislumbrando nenhuma das nulidades arguidas. Ocorre, contudo, que o art. 145, I, V, X da Lei 236/91 somente prevê uma única pena quando houver crime contra administração pública, improbidade administrativa, lesão aos cofres públicos e dilapidação do patrimônio municipal, que é a demissão, in verbis:
“Será aplicada ao servidor a pena de demissão nos casos de:
I -crime contra a administração pública;
V -improbidade administrativa;
X -lesão aos cofres públicos e dilapidação do patrimônio municipal;”
Portanto, se a Lei não prevê outra penalidade para o “ladrão do patrimônio público”, parece intuitivo que a mera referência ao artigo que estabelece a sanção já é fundamento mais do que suficiente para sua imposição, já que se trata de ato administrativo vinculado e não discricionário. E mesmo que assim não fosse, a comissão processante fez referência a pelo menos um fundamento na dosimetria da pena (“como sendo o único beneficiários nos abastecimentos realizados com os cartões e senhas” – sic), o que é idôneo para a demissão, pois, afinal, o desvio era para favorecer o próprio servidor que o praticava, o qual foi acolhido pela autoridade com competência ao ato demissionário. Não há de se confundir ausência de fundamentação com fundamentação sucinta, o que também afasta o derradeiro argumento para macular o PAD. Em conclusão: nada há ser reparado no procedimento administrativo, até pelo contrário, pois a comissão processante mostrou-se inclusive com um zelo demasiado, do que decorreu apenas prejuízo para o Município, diante do pagamento de salários(…)”. Nada mais precisa ser dito, devendo ser mantida na íntegra a bem lançada sentença.