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O legado e a grandeza de José Tude de Godoy

Médico, político, humano no mais amplo sentido da palavra. Mais do que um nome, sua lembrança permanece viva na memória da cidade que ele adotou como sua e da qual tornou-se símbolo, exemplo e saudade

As muitas faces de um mesmo homem que foi médico, político, pai e avô estimado. Um nome que se eternizou em forma de livro, bairro e de duas escolas – uma de ensino fundamental e outra de educação infantil. O personagem que me acompanhou nas últimas semanas foi prefeito de Dom Pedrito e teve sua casa – um símbolo do patrimônio histórico da Capital da Paz – transformada por seus descendentes em um espaço de fomento à cultura e ao desenvolvimento regional.

José Tude de Godoy, o Zeca, como era carinhosamente chamado por seus familiares, nasceu em Bagé no dia 13 de setembro de 1890. Filho de Cândido José de Godoy e Delphina Ferrando Godoy, foi criado pelo avô paterno e por uma tia até os 12 anos de idade, na cidade de Rio Grande, de onde saiu por decisão do mesmo que entendia que era hora de o jovem dedicar-se inteiramente aos estudos, em um grande centro, com bons educandários. O destino lhe empurrava para a capital do estado.

Aluno exemplar desde as séries iniciais, José Tude de Godoy formou-se em medicina no ano de 1913, em Porto Alegre. O título de doutor, ostentado com orgulho, veio naquele mesmo ano, quando defendeu sua tese de “doutoramento” – hoje doutorado -, iniciando assim uma promissora carreira.

Verdadeiramente vocacionado para a profissão que escolhera, seu nome começou a ganhar destaque já nessa época, resultando em inúmeros convites para clinicar na capital gaúcha. No entanto, o jovem Dr. Godoy tinha um objetivo bem definido: atuar em alguma cidade do interior, onde deveria abrir um consultório próprio.

A escolhida

Dentre as opções da época, Dom Pedrito lhe pareceu a melhor escolha, já que sua relação com a Capital da Paz começara a ser escrita antes mesmo de seu nascimento, visto que seu pai, que era engenheiro, foi responsável pela construção de uma das estradas que liga a vila de São Sebastião ao município. Outro grande feito na carreira de seu progenitor foi a construção de uma das principais atrações turísticas na Praia do Cassino, os Molhes da Barra.

Certo do que almejava para sua vida, José Tude de Godoy chegara em Dom Pedrito no ano de 1914, munido da carta de recomendação de um médico mais experiente e renomado. Já instalado neste pago, monta seu primeiro consultório, onde começa a atender alguns primeiros clientes, ganhando a confiança dos mesmos e conquistando um dos melhores tipos de publicidade à época: comentários a respeito de seu serviço.

Um amor, um casamento e a formação de uma família

Foi justamente assim, exercendo seu ofício, que o recém chegado Dr. Godoy conheceu Aida Almeida, sua então paciente, por quem se apaixonou. O namoro virou casamento meses depois, em 04 de novembro daquele mesmo ano de 1914. Deste amor, que durou a vida toda – foram 65 anos de união -, nasceram os quatro filhos do casal: Delphina, Adda, Alberto e Álvaro José.

Sem grandes extravagâncias, a vida em comum foi se forjando aos poucos. Antes da imponente construção no estilo bangalô, erguida em 1926 no cruzamento das Ruas Júlio de Castilhos e José Bonifácio – hoje popularmente conhecida como Casa Amarela -, a família Godoy viveu em outras duas residências, a primeira delas na Rua Andrade Neves, a outra na Avenida Rio Branco. Mas independente do endereço, uma mesma característica se fazia notar pela comunidade: as portas da casa estariam sempre abertas pra quem precisasse.

Não importava o horário, tampouco as condições climáticas; fosse um dia de sol escaldante ou madrugada de chuvas torrenciais, Dr. Godoy cumpria o juramento que havia feito ao se formar e atendia a todos de bom grado. Considerava-se um médico de campanha, sem luxos; foram muitas as madrugadas em que montado “no lombo de um cavalo” e tendo como companhia o sopro do Minuano ele cruzou estradas rumo ao interior para curar uma febre ou trazer à luz da vida um ser humano.

O político

José Tude de Godoy era um democrata ferrenho e defensor de seus ideais. Maragato que se fazia identificar pelo lenço vermelho no pescoço! Esteve ao lado do também médico, jornalista, professor e político Raul Pilla, no dia 28 de janeiro de 1928, em Bagé, na fundação do Partido Libertador.

A política fazia parte de sua essência, no entanto, apesar de toda a sua gana, José Tude de Godoy não esboçava o desejo de disputar uma eleição, até que em 1947, por pressões de amigos e correligionários, aceitou candidatar-se ao cargo de prefeito de Dom Pedrito. Sem muita surpresa, foi eleito com a maioria dos votos e esteve à frente do Palácio do Ponche Verde até 1951.

Durante seu mandato, executou grandes obras: construiu o Hospital São Luiz, o prédio do antigo Fórum, a via férrea (Ponte Seca) de Torquato Severo, a Biblioteca Ruy Barbosa; projetou também 11 escolas rurais, das quais quatro inaugurou ainda enquanto prefeito. Nesta mesma época, mensalmente abria mão de 10% de seu salário para instituições de caridade, gesto comprovado através de um recibo, enquadrado e fixado pela família na parede de seu antigo escritório.

Generosidade

Contribuinte assíduo até o fim da vida de diversas entidades da Capital da Paz, a generosidade era mais uma das muitas singularidades deste expoente, eleito Cidadão Pedritense – um justo reconhecimento para quem tomou esta terra como sua, firmando aqui suas raízes. Tal virtude que foi destacada através de inúmeros depoimentos que constam no livro “Dr. José Tude de Godoy: vida e obra”, publicado em 1990, da professora, escritora e poeta, Marília Alencastro Maia.

Humanitário, atendia a todos sempre com a mesma cordialidade. Sua grandeza era reconhecida e sua figura reverenciada pela comunidade. Prova deste amor aconteceu em um de seus aniversários, em 1927, quando foi presenteado pela população com um carro zero-quilômetro.

O automóvel foi empurrado pelas ruas da Capital da Paz até a Casa Amarela, onde foi entregue de surpresa ao aniversariante. Uma multidão se reuniu em torno da residência para acompanhar a cena e demonstrar seu carinho por aquele homem que ao se aposentar da medicina, décadas mais tarde, se desfez do caderno de clientes em dívida. O fim de sua carreira representava também o fim de qualquer pendência financeira decorrentes de seu serviço.

A saudade

José Tude de Godoy viveu muito: foram 89 anos de total entrega à vida. A notícia da morte deste expoente, em 29 de abril de 1980, comoveu chimangos e maragatos, e o último adeus ao grande líder ocorreu no salão nobre da prefeitura. Mais do que o nome, a lembrança da grandeza de José Tude de Godoy permanece viva na memória da cidade que ele adotou como sua e da qual tornou-se símbolo, exemplo e saudade. 

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