Escravismo em Dom Pedrito é tema do 2º episódio do Antena Qwerty
Conheça mais sobre este que é um dos períodos mais tristes da nossa história.

Considerado um dos períodos mais tristes da história do país, o período escravagista brasileiro se notabiliza por ter sido um dos mais desumanos regimes escravocratas do mundo. Somos de longe, o país que mais traficou escravizados no mundo. Estima-se que Brasil tenha chegado à escandalosa marca de 5 milhões de negros escravizados, capturados em diferentes regiões do continente africano.
O escravismo em Dom Pedrito
O desenvolvimento do município de Dom Pedrito muito deve ao suor e sangue desses negros que, subjugados, deram suas vidas para que esta terra prosperasse.
A presença dos negros escravizados na região de Dom Pedrito é discutível, ao menos a necessidade de sua presença, uma vez que, de acordo com o escritor José Antônio Dias Lopes, eles poderiam ser facilmente substituídos pelos gaúchos que perambulavam pela região. Mas isso também é discutível, uma vez que sua mão de obra era bem mais barata.
Em nossa região, eles têm sua presença registrada a partir do ano de 1810, quando acompanharam a chegada dos primeiros sesmeiros, como Antônio Garcez de Moraes. Eram utilizados nas lidas campeiras e serviços domésticos. Dos 8132 habitantes de Dom Pedrito em 1858, pelo menos 1/3 disso era de escravizados.
Nas estâncias, ele tinha, além da ocupação campeira, sempre vigiada por um capataz ou feitor, a função militar, de defesa da vida, do patrimônio de seu senhor e a qualquer momento poderia ser recrutado para lutar contra os castelhanos.
Às negras, estavam reservados os serviços domésticos. Eram cozinheiras, mucamas, copeiras, lavadeiras, engomadeiras, costureiras. Como era comum em todo o Brasil, muitas desempenharam o papel de concubinas de senhores e seus filhos e vem daí os primeiros cruzamentos.
Existiram, contudo, negros que desempenhavam funções consideradas privativas de mulheres e vice-versa, isso para a época. Assim, há registros de negros que foram excelentes cozinheiros e mulheres que eram eximias amazonas. Em Dom Pedrito houve também negros artesãos, alfaiates e vendedores. Já as crianças auxiliavam os mais velhos em ocupações mais leves.
O valor do escravizado
É sabido que o valor do escravizado era alto. No primeiro inventário de Bernardino Ângelo da Fonseca, realizado provavelmente em 1870, um negro de nome Ventura, com dezenove anos, foi avaliado em um conto e 200 mil reis, algo por volta de R$ 150 mil em valores atuais.
Alimentação
JA conta em seu livro que Demétrio Jose Xavier, o Barão do Upacaray, chegou a ter 100 famílias de escravizados e que os alimentava com carne assada e puxero de leite servidos a vontade. Outros menos generosos forneciam apenas um naco de carne assada ou charque com farinha de mandioca.
Tiro ao negro
Isso faz referência a uma cruel prática do estancieiro Francisco de Matos, proprietário de terras na região de Santa Maria Grande. O macabro evento ocorria sempre nos churrascos de fim de ano. Ele mandava um de seus escravizados sair correndo campo a fora. Apoiado no parapeito de sua fazenda, quando ele alcançava certa distância, Matos efetuava um disparo de pistola. Se errasse, o negro recebia a carta de alforria. Conta-se que Matos errou uma única vez.
Os castigos.
As faltas costumavam ser exemplarmente castigadas. Ao menos três castigos eram bem difundidos na terra do Ponche Verde
- As cadeias – correntes de ferro colocadas nos pulsos e nas pernas;
- O palanque – Em um pau forte fincado no chão com cerca de dez palmos de altura, o negro era amarrado e espancado;
- A estaca – quatro estacas fincadas no chão dispostas em retângulos com cerca de três palmos de altura. O negro era colocado em posição horizontal, suspenso do solo, ali permanecendo virado para cima ou para baixo, sob chuva, sol e sereno.
A instituição da escravatura em Dom Pedrito se manteve quase sem alteração até 1860, quando simpatizantes do abolicionismo começaram a se erguer, entre eles o Barão do Upacarai, ironicamente um dos maiores senhores de escravizados do município. Com a assinatura da Lei do Ventre Livre em 1871, a princesa Isabel deu novo folego ao movimento que aumentava seus adeptos.
Revoltas e debandadas
O negro escravizado, ao contrário do que muitos contam, não era um indivíduo incapaz de reagir. Ocorreram suicídios, fugas e ao menos uma grande tentativa de assassínio de senhores. Debandadas também foram registradas a partir de 1845, quando Manoel Oribe Então presidente do Uruguai decretou o fim da escravidão no país vizinho. Estas tentativas ocorreram na região do Ponche Verde e Upacarai e contou com mais de cem escravos. A estratégia era cada negro matar seu senhor e depois fugir para o Uruguai. Descobertos, os conspiradores foram palanqueados e açoitados com rabo de tatu por 13 dias.
O teatro e a abolição
Com a divulgação dos ideais abolicionistas, Dom Pedrito, também, organiza a sua agremiação. A mais importante foi a “Esperança e Caridade”, que promoveu no anos de 1883, quatro libertações mensais, em média. A renda obtida com essas apresentações era destinada ao fundo de emancipação ou a compra de alforrias. Além das libertações feitas pelo fundo de emancipação, havia as libertações espontâneas. Num espetáculo, em 7 de setembro de 1884, com a sala super lotada, foram lidas solenemente cinco cartas de liberdade, sem qualquer ônus, concedidas pelos senhores Cel. João Antônio Caminha a seu escravizado Adão; Barão do Upacarahy, a seu escravizado Florêncio; Boaventura José dos Santos, a seu escravizado Manuel e Maria Joana dos Santos Paiva, as suas escravizadas Natividade e Quintilhana.
O Barão do Upacarai chegou a propor em uma publicação na Gazeta Pedritense que os proprietários de escravizados concedessem a liberdade aos seus tutelados com a condição de que estes ficassem em suas propriedades durante mais três ou cinco anos, sem descartar a possibilidade de liberdade imediata, que veio em 1888, por ocasião da lei Áurea.
Mas este ato protocolar realmente libertou os negros escravizados? Esta é um questionamento que deixamos a você sobre ação do homem sobre um povo que até hoje não teve a reparação devida.
Colaboração
- Adilson Nunes de Oliveira – Professor, museólogo e diretor do Museu Paulo Firpo
- Acervo do Museu Paulo Firpo
Referências
- Livro A cidade de Dom Pedrito – José Antônio Dias Lopes
- Livro Memória do teatro – Adilson Nunes de Oliveira
- Livro de Escravo a Liberto, um difícil caminho – Instituto Estadual do Livro